Residência artística no Brasil: Campo de Heliantos, em Alter do Chão
Está buscando uma residência artística no Brasil? Se você se dedica a algum tipo de arte e gostaria de fazer uma viagem pra Alter do Chão, na Amazônia, com uma pegada imersiva e poética, tenho uma recomendação. O Campo de Heliantos promove programas de residência no meio da Floresta Amazônica mediados por curadores especialistas em diferentes formas de expressão artística, com foco principal na literatura. Eu participei de uma edição e foi super especial. Neste post, vou contar sobre o espaço e compartilhar minha experiência lá.
O que é uma residência artística?
O conceito de “residência artística” foi popularizado por volta da década de 1980. Existem vários modelos, mas em linhas gerais, a ideia é dar ao artista a oportunidade de se inserir num novo contexto por um tempo e, assim, desenvolver um processo de criação influenciado pelo ambiente e a comunidade local e por outros artistas.
Esses programas podem ser públicos ou privados e incluir ou não oficinas, palestras ou acompanhamento de curadores, professores ou críticos de arte.
A ideia é ter um tempo de dedicação total à produção artística e aos processos criativos relacionados a ela, além de criar laços com pessoas da área e ter novas inspirações pra seus projetos. É como uma pausa na vida cotidiana para se dedicar à reflexão e experimentação, usufruindo de um ambiente e uma programação que incentivam isso.
Alguns programas são focados em uma expressão artística específica, como escrita ou fotografia, enquanto outros acolhem participantes de diversas áreas. O período de duração de uma residência artística varia, podendo ir de alguns dias a várias semanas ou meses.
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Residência artística no Brasil: Campo de Heliantos
Campo de Heliantos é uma residência artística na Floresta Amazônica, na vila de Alter do Chão, no Pará. Ela foi criada com o objetivo de aproveitar os ritmos e elementos da floresta como estímulo à produção artística. Sua proposta é servir como núcleo de investigação do “Eu criativo”, encorajando a produção de pensamento crítico sobre o mundo que nos rodeia e o desenvolvimento de uma poética inspirada por esse ambiente tão rico. As vivências artísticas promovidas lá incluem leituras, debates, oficinas, saraus, palestras, performances e outras atividades.
O local foi criado pela escritora gaúcha Graziela Brum, idealizadora do projeto literário Senhoras Obscenas e autora de romances como Jenipará. Ela se apaixonou por Alter e construiu esse espaço para receber outros artistas e criar conexões. A cada edição, geralmente há outros artistas convidados que colaboram na organização e oferecem oficinas aos residentes. Como explica Grazi, “a geografia de Alter do Chão, rica em recursos naturais, permite que os participantes se reconectem à natureza e à sua própria produção”. Foi bem isso que senti quando estive lá!
Por que uma residência artística em Alter do Chão?
Achei o cenário escolhido maravilhoso. Caso você ainda não tenha ouvido falar Alter do Chão, aqui vai uma pequena introdução: a vila fica a 34 km do aeroporto de Santarém, no Pará, e é conhecida pelas lindas praias de água doce cercadas pela Floresta Amazônica. As faixas de areia branca banhadas pelo Rio Tapajós aparecem no período da vazante do rio, entre agosto e fevereiro. Estive lá no início de setembro e achei perfeito.
Durante a cheia, costuma chover bastante, mas me disseram que ainda assim vale a pena ir para lá. Nessa época você pode admirar os cenários lindos formados pela exuberância das águas e fazer passeios de barco e caminhadas na floresta.
Além de curtir as muitas praias de rio, seja as que ficam bem na vila ou as dos arredores, um passeio muito especial em Alter é caminhar pela Floresta Nacional (Flona) do Tapajós. Eu fiz esse rolê depois da residência, num tour de dia inteiro a partir da comunidade do Jamaraquá.
Lá, fizemos uma trilha guiada por um morador da comunidade, que explica várias curiosidades sobre as árvores da floresta, com destaque para suas propriedades medicinais. Também fomos até um mirante com vista incrível e vimos uma linda sumaúma, árvore centenária gigante. Por fim, tomamos banho num igarapé lindíssimo.
Outras atrações de Alter do Chão são o artesanato indígena, as comidas típicas e as noites de festa, com direito a muito carimbó. Em setembro, acontece por lá um grande festival que mistura tradições indígenas e religião católica, o Sairé.
Como é a estrutura de Campo de Heliantos?
As instalações do Campo de Heliantos são pensadas para colocar o residente em contato direto com a diversidade da floresta. No local é possível encontrar macacos guaribas, prego e shuiem, além de várias espécies de aves. Eu só vi macacos uma vez, mas escutei seus barulhos à noite. E que delícia que era acordar ouvindo apenas o canto dos pássaros!
Mesclando arquitetura tradicional e técnicas indígenas, as cabanas foram construídas com madeira reutilizada, palha e barro. É um ambiente bem rústico, o que o torna muito especial.
O espaço conta com cozinha, mesas para refeições e oficinas, ateliê de impressão e encadernação e acomodações para 12 pessoas. São seis quartos duplos integrados à floresta, sem paredes, mas com mosquiteiros nas camas. Cada quarto tem também banheiro (só com privada e pia), mesa de estudo e rede. Na área coletiva ficam os chuveiros, que são meio abertos, de frente para a floresta.
Uma parte importante da experiência é se livrar de tabus e superar possíveis medos, já que não há muita privacidade nos banheiros e chuveiros e alguns pequenos animais, como sapinhos e aranhas, podem aparecer por lá. Achei que seria mais desafiador, mas chegando lá eu me senti tão “natureza” que não me incomodei muito com nada disso. Foi realmente um processo de “reflorestar-me”.
Campo de Heliantos fica a uns 20 minutos de caminhada da Praia do Jatobá, que é bem bonita e não é tão visitada por turistas, e de um igarapé. De lá também dá para ir a pé até a Pousada Amazônia, onde é possível passar o dia consumindo no bar e curtindo a piscina e um igarapé. Para chegar na vila, o mais prático é pegar um mototáxi ou táxi – o pessoal da residência informa o contato de motoristas de confiança e a corrida dá, hoje, cerca de R$ 30.
Como foi minha experiência na residência artística em Campo de Heliantos?
Eu participei de uma residência artística literária em Campo de Heliantos de 6 a 11 de setembro de 2024, a convite de Graziela Brum. Não sabia muito bem o que esperar, mas embarquei muito animada e aberta para o que podia vir. E veio um tanto!
Essa edição teve como tema “Fogo Lava Água”, e como você deve imaginar, usamos bastante o fogo e o rio Tapajós como interlocutores e fontes de inspiração para nossas criações.
Nesses dias por lá, pude ter lindas trocas com escritores com produções super interessantes, vindos de todas as regiões do Brasil, cada um com um estilo e uma bagagem muito diferentes. Foi uma oportunidade de sair do engessamento da cidade grande e mudar meu ângulo de visão, usando a natureza e as abordagens criativas dos demais residentes como substrato para minha criação.
Tivemos tempo livre, em que cada um decidia se ficava por lá escrevendo ou ia passear, e oficinas que me fizeram sair da zona de conforto e explorar novas formas de expressão. Além das tantas chances de reflorestar-se, mergulhar em travessias poéticas deixando-se atravessar, dançar até o pé doer e ouvir o que o rio tem a dizer.
Eu já conhecia a Amazônia, mas é sempre mágico voltar, e ainda mais em uma experiência tão cheia de significado. Muito mais que ocupá-la com arte, pudemos deixar-nos ocupar por ela. Foi um período bem intenso, que movimentou coisas importantes dentro de mim e ajudou a reacender desejos criativos. E a melhor parte é que a residência não acaba no dia previsto: ela fica com a gente.
Como participar das próximas residências artísticas em Campo de Heliantos?
Acompanhe o perfil do espaço no Instagram (@campodeheliantos) ou mande um e-mail para [email protected], para que Graziela te informe as datas da próxima imersão. Quando as vagas estão abertas, geralmente ela manda um formulário para os interessados preencherem e faz entrevistas online para tirar dúvidas sobre a experiência e avaliar o alinhamento à proposta.
O investimento geralmente fica em torno de R$ 4 mil, incluindo a acomodação, todas as refeições e as oficinas e demais experiências promovidas por Grazi e outros curadores convidados.
Também é possível passar um período mais longo por lá, num programa de residência focado em quem quer se reconectar à criatividade através do mergulho na Amazônia. A liberdade que o programa traz incentiva a auto reflexão e ideias para construção de projetos de arte sem pressa.
Ah, e dá também para se hospedar em Campo de Heliantos pelo Airbnb. No Natal e no Ano Novo, Grazi costuma fazer um jantar para os hóspedes e deve ser muito legal.
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4 Comentários
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Que matéria linda, obrigada. Estamos esperando você em agosto aqui em Alter do Chão.
Ansiosa desde já! :)
Uma baita oportunidade de autoconhecimento, de imersão na Amazônia, de novos ares, aprendizados e novas amizades
Demais, Tatiane! :)