Vamos parar de falar em “atrações imperdíveis” em viagens?
Talvez você já tenha escutado ou participado de umas conversas-competição que às vezes rolam entre viajantes. Aquelas em que cada um fica contando o que fez na cidade onde estão ou em outros destinos por onde passaram antes, num tom que mais parece uma disputa pra ver quem aproveitou melhor a viagem.
Em algum momento, esses papos costumam incluir comentários como: “mas como assim você não foi em TAL LUGAR? É imperdível!” ou “não deixe de ir na cidade tal e ver tal coisa!”. Os mais radicais chegam até a proferir o clichê “ir no lugar x e não ver a coisa y é o mesmo que não ir”.
Confesso que tenho me policiado cada vez mais, mas vez ou outra ainda devo cometer o erro de falar em “atrações imperdíveis”. Capaz até de já ter usado uma palavra ainda mais abominável: “obrigatório”.
Como se viajar fosse uma tarefa a ser cumprida com louvor pra merecer a nota máxima. Ou, quem sabe, um jogo: “parabéns, você zerou essa cidade! Troque as fichas por um unicórnio de pelúcia”.
Como se não fosse evidente que cada experiência é única, cada pessoa tem suas prioridades e cada viagem tem suas condições. Como se o processo de cada um na descoberta do mundo não fosse extremamente pessoal.
E como se não fosse uma pena transformar prazer, aprendizado, desafio e tantos outros substantivos bonitos que podem ser atrelados à palavra “viagem” num bem feiosinho: competição. Reduzindo, assim, uma experiência potencialmente transformadora a uma check-list de pontos a riscar do mapa.
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Uma das coisas mais libertadoras da minha vida foi perceber que diversão não é obrigação, nem no dia a dia, nem muito menos numa viagem. Obrigação é respeitar os lugares, as pessoas e as culturas. Imperdível é viver a vida que cada um quer, tanto como puder, desde que não prejudique ninguém.
Já ignorei solenemente programas que me pareciam cansativos demais, caros demais ou que simplesmente não me interessavam, por mais “famosos” que fossem. Já deixei de ir a museus pra ficar conversando com alguém que conheci e “desapeguei” de uma atração porque exigia reserva prévia e eu não queria ficar com itinerário amarrado, por exemplo. E não me arrependo nem um pouquinho.
Continuo pesquisando muito e seguindo itinerários porque isso me diverte, porque minha personalidade é mais “planejadora” e porque esse é meu trabalho e quero mostrar coisas legais pra vocês. Mas tento não esquecer que as prioridades de ninguém devem ser definidas por essa pressão esquisita que tende a repercutir entre muitos viajantes.
O FOMO (fear of missing out, algo como “medo de ficar de fora”) é um bichinho terrível que insiste em morder a maioria de nós, especialmente nesse mundo Big Brother das redes sociais. Mas uma forma de lidar com ele, acredito, é entender o que você realmente gosta de fazer e se importar menos com o que “todo mundo faz” ou o que dizem que você “não pode perder”. E, claro, parar de reproduzir esse discurso e provocar o mesmo sentimento nos outros.
Acontece muito: tou viajando, publico fotos e vídeos no Instagram e alguém vem falar: “ahhhh você tá em tal lugar! NÃO DEIXE de ir não-sei-onde!”. Eu entendo que a pessoa tem a melhor das intenções quando diz isso. Fico agradecida demais por me mandarem dicas e já descobri muita coisa legal assim. Acho super incrível, afinal, alguém gastar alguns minutinhos da vida ocupada pra vir compartilhar comigo uma recomendação.
Mas acho que esse tom de “imperdível”, que traz embutida a ideia de que sua viagem vai ser incompleta ou menos interessante se você não fizer algo específico, poderia ser revisto. Tanto nas dicas que damos pra os amigos e conhecidos quanto nas listas de “x atrações imperdíveis na cidade tal” que sempre circulam por aí.
O ponto alto de nenhuma das minhas viagens a Paris foi ver a Torre Eiffel. Minha primeira visita a Barcelona não teria sido nem um pouco menos incrível se eu não tivesse entrado na Sagrada Família. O Cristo Redentor foi apenas um detalhe em todas as vezes em que fui no Rio.
Não que os pontos turísticos tradicionais não possam ser incríveis ou mesmo emocionantes, mas não existe nenhuma regra determinando que todo mundo tem que dar o mesmo nível de importância pra eles. E dar uma variada é bom até pra o destino, que não fica com lugares específicos “sobrecarregados”.
Sem falar que muitas das nossas experiências mais especiais são pessoais, né? O mais marcante de uma viagem quase sempre tem a ver com as pessoas que encontramos, lembranças que construímos junto a gente querida ou coisas que percebemos sobre nós mesmos ou sobre o mundo. E vai dizer que isso não é massa?
Sim, é claro que é natural querer falar de algum lugar que adorou e querer que todo mundo vá conhecer. Mas acho importante lembrar que qualquer roteiro ou dica nada mais é do que uma sugestão. Tipo aquelas receitas que vêm na embalagem do macarrão, sabe? Quem vai comer é você, então prepare a bendita macarronada como bem entender.
Pra conferir muito mais conteúdo sobre viagens todos os dias, siga o Janelas Abertas no Instagram e no Youtube. Espero você lá! :)
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7 Comentários
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Duas frases que saem demais da minha boca quando estou vendo/conhecendo lugares novos são: `já dei por visto ` e ` I´m ready to go whenever you are`. kkkkk
hahhaah :) Com relação a pontos turísticos também sinto que às vezes que “já dei por visto” :P
Sempre lembro que a primeira vez que senti muita emoção em uma viagem foi na Esplanada dos Ministérios. Eu mesma não sei direito porque me senti dessa forma, mas o fato é que esse sentimento fez com que fosse uma “atração” especial para mim e definitivamente a Esplanada não está na listinha de “atrações imperdíveis” de Brasília.
Quase nunca cometo, mas gosto muito do seu blog. :D
Oi, Nívea! Que legal, obrigada por comentar! É sempre bom conhecer um pouquinho quem tá do outro lado da tela :D E sim, é muito pessoal mesmo, né? :) Ainda não conheço Brasília, mas já aposto que o que vai me encantar por lá não vai ser nenhum dos destinos de “cartão postal”. Um abraço!
Excelente texto, Luísa! Concordo demais: cada pessoa é única e, dessa forma, não faz sentido se falar em “imperdível” ou “must do” de forma absoluta. Parabéns pelo blog! :-)
Eu não diria que não vale a pena subir na Torre Eiffel , estar nela em si é uma emoção. A vista de Paris é total , e gente de todo planeta quase colado a você expressando em todas as línguas , Uh La La como é lindo o traçado da cidade , os parques etc .. Você provavelmente levou umas 3 horas em filas e pagou muitos Euros para estar naquela multidão , quando não muito distante , um arranha-céu que você vê da Eiffel como uma coisa horrenda de 60 andares , 50 de idade , muito xingado pelos parisienses .Torre Montparnasse , com seu observatório não muito mais baixo que a Eiffel , vista total de Paris incluindo a Torre Eiffel . quase sem fila, 3 minutos pra chegar no topo no elevador mais rápido da França , e , por metade do preço , Uh La La ……
Oi, Ricardo! :) Tudo vale a pena de acordo com nossos interesses, né? A ideia do texto era falar que não existe nada “imperdível” ou “obrigatório” como se fala muito por aí… E sim, existem muitas vistas deslumbrantes em Paris! Já subi em muitos lugares altos por lá, mas minha vista preferida ainda é da Notre Dame :) Seja como for, a cidade é mesmo linda. Um abraço!